A Santidade do Ódio e a Cosmética da Fé
Vamos direto ao ponto. Embora eu não seja um santo - aliás, nem perto disso estou - e reconheça que os pecados são nossos amigos mais íntimos, tenho aqui uma grande incógnita para dissecar: decodificar o código Morse do preconceito em nome da divindade, um assunto que chega a arranhar minha alma, e acredite, ela já está tão arranhada quanto a casca de um coqueiro em praia de surfista.
Você se lembra da história Bíblica do "Bom Samaritano", não? Aquele sujeito que, embora desprezado pela sociedade, teve a decência de ajudar um estranho em apuros, enquanto todos os outros passavam batido.
Pois bem, na nossa versão moderna do "Bom Samaritano", este personagem está um pouco confuso com essa temática. Ele não perde um culto/missa dominical sequer, mas não estende a mão pro mendigo que está na porta da igreja. É aquele que repete "amar ao próximo como a si mesmo", mas decide que alguns "próximos" não se enquadram nessa categoria. O tal do "Falso-Bom-Samaritano".
Este Falso-Bom-Samaritano - pra piorar - ainda vem afagado pela tática preferida do "Falso-Bom-Pastor-Samaritano": o discurso de ódio travestido de pregação religiosa. "Oh, não é nada pessoal", diz ele. "Estou apenas expressando minhas crenças." "Tá na Bíblia".
O Falso-Bom-Pastor-Samaritano pode estender a mão para um mendigo e, no minuto seguinte, verbalizar ataques homofóbicos disfarçados de sermões. E, no mesmo minuto (ou no instagram story seguinte), voltar ao seu "culto" de dinheiro, status e poder, descartando a necessidade de introspecção, de uma verdadeira análise de suas ações.
Nessa montanha-russa de "bondade", a hipocrisia é o loop mais vertiginoso.
Recentemente, um querido e enfadonho Pastor, cujo o nome e imagem não preciso mencionar, está com o hábito irritante de recitar o evangelho de seu próprio preconceito. O mesmo prega sobre o amor com o mesmo fervor que a "tia do pastel" frita seus pastéis na feira de domingo, mas esquece que a panela que usa é de intolerância. Esse homem, por alguma razão desconhecida, começou uma "série" de sermões sobr o que ele julga ser o maior de todos os pecados: a homossexualidade.
Enquanto esbraveja do alto do púlpito (e nas redes sociais), esquece que a pedofilia, o adultério, a sonegação fiscal dançam no confessionário da igreja ao lado. O "bom" pastor acredita estar à altura do dedo de Deus, apontando o que é certo e errado, enquanto esquece que, no fim das contas, é apenas o dedo-do-meio do ódio que a sociedade vê sendo apontado.
E veja bem, não é que eu tenha algo contra o ódio, ele tem seu lugar. Eu tenho meus ódios, mas sempre tive o bom senso de odiar coisas importantes, como (uvas)passas no arroz, gente lerda no trânsito, meias que sempre somem nas máquinas de lavar, e pessoas que usam a palavra "influencer" sem um pingo de ironia.
Por que, pergunto eu, o Falso-Bom-Pastor-Samaritano resolveu despejar sua fúria divina sobre uma fatia da sociedade que apenas busca viver de acordo com sua natureza? Será que a palavra amor perdeu seu significado na Bíblia que ele lê? Onde está a empatia? E onde diabos está o bom senso?! Porque, acredite em mim, quando a homofobia disfarçada de religião causa dor e morte, o bom senso está perdido e o amor foi substituído pelo medo.
Mas, hei, calma, péra-lá, ele está protegido pela liberdade de expressão e de culto, certo? Mas aqui está a coisa: liberdade de expressão não é sinônimo de licença para difamar, para incitar ódio.
O que é preciso lembrar é que a fé, em sua melhor forma, promove o amor e a compreensão, não o ódio e a intolerância. O Falso-Bom-Pastor-Samaritano se esqueceu disso. Ou pior, escolheu se esquecer. Porque a verdade, minha gente, é que uma fé que incita ao ódio é uma fé falida, uma fé que perdeu sua essência divina.
O estranho é que, em nosso Estado Democrático, onde o futebol é mais cultuado que a própria religião e que os homens são mais fiéis aos seus clubes do que à suas companheiras, ainda exista palanque para essas vozes que propagam discórdia e preconceito. Na verdade, por vezes me parece que vivemos na democracia do absurdo, onde cada um tem o direito de vomitar suas opiniões, mas se esquece do dever de limpar a própria sujeira.
Não confunda as coisas, não estou aqui para criticar a fé, pelo contrário. Sou Cristão e acredito (e sei, míninamente, interpretar e contextualizar) as palavras da Bíblia.
O que critico é o verniz de religiosidade usado para justificar preconceitos. É igual a um sujeito mal-intencionado que se veste de palhaço para enganar crianças. Alguns Falsos-Bons-Samaritanos se escondem atrás de uma suposta religiosidade para destilar ódio.
No final do dia, talvez seja isso que separa o verdadeiro Bom Samaritano do Falso. O primeiro age por amor, o segundo por medo. O primeiro abre a mão, o segundo a fecha. O primeiro constrói pontes, o segundo, muros.
E para encerrar, querido leitor, lembre-se sempre das sábias palavras do profeta do fim do mundo: "Não é porque você está certo que não está errado".
Com isso, me despeço, deixando você a cargo de seus próprios demônios, e quem sabe, de uma fé um pouco mais humana.
Amém.
Excelente texto! É exatamente isso, professar a fé e falar sobre pecados é diferente de criar uma ideologia de ódio
ResponderExcluirTô sem palavras aqui. Tudo que precisava ser dito vc disse! Parece que eu acabei de ler tudo que tá engasgado em mim, mas eu nunca ia conseguir por pra fora com as palavras exatas que vc usou! Que incrível isso!
ResponderExcluir👏🏻👏🏻👏🏻
ResponderExcluirExcelente
ResponderExcluir